Você já ouviu falar sobre a cultura do cancelamento? Este termo vem sendo amplamente utilizado e discutido quando se fala sobre manifestações de boicote contra pessoas que, em suas redes sociais ou publicamente, adotaram posturas consideradas incoerentes ou questionáveis. Mais comum quando direcionado aos famosos, a ideia de cancelamento do sujeito nos leva a refletir sobre atitudes semelhantes em nossas relações sociais.

Anônimos como nós também estão sujeitos ao “cancelamento”, caracterizado pelo abandono e desprezo da pessoa que, de algum modo, destoa do grupo em algum sentido (divergências de opinião, diferenças de personalidade, dentre outros). Os efeitos dessa situação podem acarretar consequências sérias ao “cancelado”, afetando sua saúde mental. Se o “cancelamento” causa efeitos negativos no ambiente virtual, é possível transportar essa ideia para as relações no ambiente de trabalho e aos impactos causados por essa atitude.

A exclusão e o isolamento característicos da cultura do cancelamento são atitudes típicas do bullying no trabalho ou mobbing. Ambos os termos são utilizados para descrever comportamentos de assédio moral no trabalho envolvendo um ou mais trabalhadores que agem de forma hostil e direcionada a um colega ou subordinado. Tais atos são caracterizados por comportamentos impróprios e repetitivos direcionados à pessoa alvo, dentre eles: humilhações, agressões, intimidação, ameaças, provocações, fofocas e rumores, privações, exclusão e isolamento, excesso de críticas injustificadas e piadas.

Episódios de bullying podem levar a consequências psicológicas e até mesmo físicas a quem se torna alvo. Ansiedade, depressão, mal-estar, problemas de sono e queixas somáticas (dores de estômago e dores de cabeça, por exemplo) são efeitos relacionados. Para a equipe e a organização, os efeitos também são negativos, podendo ser observados aumentos nas taxas de absenteísmo, piora no clima organizacional, afastamento do grupo e a intenção de deixar a empresa (aumento da rotatividade).

Então, toda brincadeira é bullying? Calma! Sabemos que as brincadeiras entre colegas (principalmente os que se conhecem há algum tempo) fazem parte do cotidiano e são - inclusive - estratégias de enfrentamento aos desafios compartilhados no trabalho; uma forma de manter o bom humor e a saúde mental. O que precisamos refletir é sobre os limites, nossos e dos outros. O limite entre brincadeira e bullying é uma linha tênue que pode ser distinta pela reação de quem sofre as provocações e pela intencionalidade de quem as faz. O limite pode estar no bom senso e no respeito ao outro. Quando o bullying é realizado em retaliação a alguma atitude do colega alvo, cabe refletir se, agindo dessa forma, estamos agindo com violência ou compaixão; se estamos dando oportunidade a ele e a nós mesmos de encontrar formas mais assertivas e saudáveis de nos relacionar e de aprender com nossos erros e com a diversidade de opiniões.

É sempre bom reforçar a importância da empatia em nosso convívio. Antes de agir, pense como seria se aquela atitude fosse direcionada a você. Pense também que não estamos no lugar do outro (apenas podemos imaginar “como se” estivéssemos) e que o que pode ser engraçado para mim, pode não ser para o outro. Vivemos um momento de fragilidade emocional potencializado pela pandemia e seus desdobramentos. Logo, os limites individuais podem variar de acordo com a realidade vivida por cada um, e nem sempre sabemos o que está acontecendo na vida do outro. Para finalizar essa reflexão, deixo uma frase do livro/ filme Extraordinário (2012/ 2017):

“Seja gentil, porque todo mundo enfrenta uma batalha. E se realmente quiser ver como as pessoas são, só o que precisa fazer é olhar. ”